quarta-feira, 27 de abril de 2011

NÉCTAR DO CORAÇÃO




Entrou bem veloz rompendo o véu da janela aberta. Lá fora o sol prenunciava a chegada na vermelhidão do céu e nas estrelas luzentes que vinham rastejando pelo capinzal. As asas pequeninas do ser trepidavam no contato com o chão e agitavam meu sono. A respiração ofegante da ave trouxe-me do sonho distante. Os olhos meio despertos pouco a pouco acolheram no coração o beija-flor.

Ele levantou voo. Tinha pousado no piso do quarto ainda gelado pela brisa da madrugada que ali se aninhou. Manteve-se no ar contemplando a sonolência de minha alma. Pedia algo. Perdi a visão do bater de suas asas, mas tinha consciência que elas sincronizavam-se velozmente. Ele insistia que me permitisse ao seu desejo. Os raios do sol já se recostavam no alpendre da janela a me espiar. Levantei e fiquei a observar o beija-flor.

A pele foi se encolhendo. Estaria sonhando? Seria uma alucinação? Estava sumindo. Só conseguia ouvir o pulsar do coração. Paulatinamente, à medida que só sentia minhas pulsações ia vendo o bater harmônico das asas do beija-flor. Quanto mais sumia, maior era a sensação forte do pulsar. Quanto mais forte pulsava, mais lento era o esvoaçar do beija-flor. O coração batia no mesmo ritmo do agitar-se das asas do beija-flor. Tão veloz e tão consciente de si.

Não precisou mais pedir. Formamos uma simbiose. Então, permiti que seu bico alcançasse as profundezas de mim para que recolhesse o néctar.  O coração abriu-se. O beija-flor silenciosamente me levou. Uma música suave e penetrante incendiou meu interior. Pela primeira vez me senti rompendo o véu de minha janela aberta.    

Nenhum comentário:

Postar um comentário