domingo, 27 de fevereiro de 2011

ECO DE CRIANÇA


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Sentado na sombra daquele grito
Eu chamava por minha infância
Pedia meus brinquedos de volta
Correr, pular, rever tanta euforia

Sentado na sombra daquele grito
Perguntei o desejo de minha alma:
Se era a inocência ou se só sorriso
Daquela criança, ela reivindicava.

Sentado na sombra daquele grito
Silêncio se fez lágrimas insossas
Queria de volta todas as carícias
Do seio de mãe que a alma adoça

Sentado na sombra daquele grito
Da ponta dos pés aos fios de cabelo
Corria a criança de volta ao regaço
Confiante que o grito era seu anelo

Sentado na sombra...
O grito não era dor ou aviso do fim
Nem só saudade ou solidão d’alma
Era eu pleno em cada pedaço de mim.


sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

AMAR É...




Amar é ....

Como a rosa que desce às fendas vulcânicas da alma.
Como pássaro que cala o canto para escutar o silêncio.
Como o peixe rompe as águas para sentir o ar do céu.
Amar é como um barco que sem remos deixa a maré.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

AQUI DENTRO HÁ FESTA

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Aqui, bem dentro de mim, há festa!
Há fogo acesso nas ondas do mar
Ritmos elétricos sem nunca parar.
Aqui, minha alma aprende a dançar.

O Sol esquenta na estação fria.

Chuva não molha a céu aberto.
Abismo não estanca os passos
Aqui, minha alma ensina a viver.

Gravetos ressequidos sonham.
Despertam nos braços da brisa
Todos ornados de folhas, botões.
A festa engravidou o coração.

Dormem as angústias, tristezas.
Ausentes dores e seus pesares.
Amargura e solidão fugidias.
Para rir essa inerte força delas.

Festa não rima com desgaste da alma.
É natural que não sejam convidadas.
A alma tem direito ao seu Festival.
Há céu aqui dentro de minha festa.

A voz soa bem distante sua sinfonia.
A alegria aos confins do som anuncia.
Sorrisos rouba, a alma do ser inebria.
Em todo canto e lugar a festa contagia.


Vem da Fonte transcendental da alma.
Ali estão os preparativos dessa festa.
Alguns chamam força, eu proclamo Deus.
Bebendo dessa Fonte me faço pleno amor.   

TREM DESCARRILHADO

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O trilho por onde os trens seguem suas direções são retilíneos; mas há também curvas e em alguns pontos possuem túneis. Outras vezes, é alto ou, o que é mais costumeiro, está firme na terra. Há aquele que vai por baixo dela. Entretanto, todas essas características que aparentam arrancar a imagem retilínea do trilho tão somente fortalecem e corroboram que o trilho é nossa história, nossa opção fundamental por onde passam nossos trens. É nossa segurança de que chegaremos aonde ele nos propõe chegar. Cabe a nós deixarmos nosso trem partir de estação em estação rumo à estação final.

O trilho é estável, apesar de sofrer mutações em sua forma. Por isso, a opção fundamental será sempre única. Porém, pode ser que o trem, por muitos motivos, desvie-se do trilho e ande por caminhos estranhos à sua natureza. Então, os vagões vão perdendo sua unidade e harmonia. O trem não se reconhece mais. Desfigurado e perdido em meio a realidades que lhe desafiam.

Ninguém é culpado a priori por ter-se descarrilhado. Somos condicionados por muitos eventos que nos levam a abandonar o trilho. É preciso, mesmo fora do trilho, continuar sonhando com ele. Mesmo na desesperança, esperar um dia trilha-lo novamente. Mas não é o sonho nostálgico do passado. É o sonho-realidade tecido na luta por compreender o desvio feito, compreender-se.

Tem culpa quem podendo sonhar, preferiu a destruição. Caído, não se permitiu levantar por outros trens cargueiros. Desanimado, não cantou com a música da buzina a chamar-lhe de volta. Tem culpa quem próprio decidiu culpar-se como sem retorno, trem fantasma.

Quem aprende a contemplar o desvio e nele se deixa questionar, logo, logo ao trilho voltará. Toda crise pode sim, e deve, ser uma seta para nosso melhor. Quando o trem deixa o caminho seguro do trilho, tem a capacidade de voltar dono de si dos percursos estranhos. E, então, nenhum outro caminho desconhecido ao seu cotidiano afugenta-lo-á de seus sonhos e de suas verdades. Pelo contrário, saberá como andar e aproveitar as andanças sem jamais tombar. Porque a crise já não será a imagem de uma sepultura aberta, mas novas setas para realidades do nosso ser, ainda desconhecidas, contudo, desejadas por nossas almas ansiosas do profundo de nós mesmos.

ROSA E A LAMA



Surgiu no meio da lama. Cresceu envolta da camada do lamaçal, terra poluída e fétida. A rosa olhou ao redor buscando o jardim do qual toda rosa ao nascer faz parte e só conseguia ver o lamaçal em que consistia sua existência. E por mais que se estendesse seu olhar só enxergava a mesma coisa.

Passava noites a fio sonhando com o jardim. Flores cantando e ninando os botões de rosa. Aglomerado de muitas espécies. Encanto e deslumbre, odores deliciosos. Porém, um dia cansou do sonho repetitivo que nunca se enraizava à sua realidade; e nesse dia, então, rendeu-se à realidade lamacenta de seu existir e não mais sonhou.

Nunca se olhou. Tão pouco sentia a textura que tinha suas folhas macias e encantadoras. O único reflexo que tinha era da lama. A tristeza reinava em suas folhas cada vez mais sem expressão. Havia como que uma força que lhe puxava para o fundo da lama. Era como se aquele pântano reivindicasse para si a existência da rosa. Pouco a pouco seu tronco foi se curvando. Perdeu a capacidade de ver longe, mesmo que nada visse além de lama, por ter a vista corrompida pela única versão que tinha das coisas.

Numa manhã cintilante em que a brisa havia passado pelo pântano pela madrugada, outra rosa nasceu tão bela quanto a outra rosa. A rosa mais antiga levantou a vista para ver sua vizinha. Não precisou de muito esforço, pois metade de seu ser já estava imerso na grande lama. A rosa, recém chegada, ainda viu algumas nuances da outra flor que lhe recordava alguma aparência do encanto que guardava em sua alma. E repetiu o ciclo daquela que acabara de ser absorvida por completo pelo grande lamaçal.        

A rosa que nascera e crescera na lama nunca soube quem de fato era e quanta beleza se encerrava em seu ser. Esquecera que não se pode parar de sonhar o que somos. O pior mal a que um ser pode ser submetido é ser levado a esquecer sua identidade, a beleza intrínseca a seu eu, a não ter, ao menos uma vez, olhado para dentro de si. Quantas rosas nascem sem a materialidade da alma. Quando nossos corações não se permitirão viver dentro de sepulturas à espera do enterro?

Nasceu na lama. Cresceu sonhando os jardins. Flores cantando e ninando os botões de rosa. Aglomerado de muitas espécies. Encanto e deslumbre, odores deliciosos. De tanto sonhar, um dia a lama deixou de ter poder sobre ela. Daquela rosa nasceram muitos botões de rosa e desses outras tantas rosas. Na história ficou a lembrança de que ali onde hoje é um lindo jardim cheio de muitas rosas existiu um lamaçal. Há rosas que vencem seus pântanos!

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

VENCER OS TÚMULOS


Ventos rodopiam nos trilhos de tua respiração. A alma toda encantada, então, suspira de emoção. Porém, é apenas um sonho que te dás o direito de sonhar com perfeição inigualável a qualquer outro existir, pois não há ventos em teu respirar que venham carregar-te para um passeio e tão pouco há trilhos propícios para tal desfrute de seu ser. Sonho.

A primavera não lhe nega as flores que traz em seu ventre. O olhar, todo embebido de suas cores e fragrâncias, anima-se em se transformar num pequeno botão de rosa, inquieto por desabrochar. E assim, tua alma anseia profundamente aquele estado de vida que chamam viver. Nasce a esperança que teima com os galhos secos que insistem na afirmação radical de que somos deserto e toda flor que se contempla não passa de ilusão.

O viver é o hoje peregrino nos trilhos do ontem. Trilho é feito para ser trilhado. O trem segue seu caminho contemplando o horizonte, mas sempre fascinado por cada passo dado à frente do anterior. O viver é essa disposição a não ficar enganchado nas ferrugens do tempo. Dizer ao coração, sem medo de expressar o óbvio, que hoje ele pulsa como nunca pulsara antes e, caminhante nos trilhos, seguir andante...     

Haverá alegria na dor; contentamento no desprezo; vitória nas derrotas; amor no ódio sofrido; sonhos nos botões que dormem na madrugada fria; pétalas nos espinhos cravados por estrangeiros de minha alma. Sempre existirá beleza e encanto, deslumbramento e fascinação onde as sepulturas não têm a força que lhe dão. O mundo é feito de puro amor. No subterrâneo de meu Universo só existe amor; em mim se esconde um tesouro, o amor. Em todo sorriso há fagulhas do amor...

Quando sentires que as pétalas de teu coração começam a murchar, não fique inquieto e a alma trespassada; Deixe que caiam. Contemple e saboreie a queda, pois na verdade a maior beleza que terás que cuidar e sentir saudades são as raízes que acolhem pétalas caídas.

ROSEIRA E A MONTANHA



Vi a rosa crescendo bem no alto de uma montanha. Era como se a textura de suas pétalas tocasse a maça de meu rosto. Seu reflexo em meu olhar devia ser causado pelo abraço do sol ou o suspirar do interior da montanha por ver nascer tão bela rosa em sua pele rochosa. Curioso, não menos maravilhado, decidi escalar a montanha. Queria tocar, saborear o deslumbre da beleza nascendo e revelando seu mistério a olhares da superfície. Só poderia contempla-la quem tivesse capacidade de voo ou, como eu, lançar-se, com todos os riscos previstos, a escalar a grande montanha.

Com o olhar fixo na primeira imagem gravada em minhas retinas, pus-me a subir. No início, senti-me enamorado pelas gramíneas, pele macia que cobria a margem da montanha. Um pouco acima, volvi o olhar para trás. Deu-me saudades, não minto, da comodidade da observação passiva. No fundo, vou ser sincero, havia uma fagulha de medo do percurso desconhecido ao lugar onde o encanto de meus olhares decidira habitar. Porém, era apenas distração do que havia me proposto. Continuei a escalada.

Já na metade do caminho senti que em mim algo estranho acontecia. Percebi um peso no meu corpo como se uma força prendesse os pés à montanha e com muita dificuldade conseguia move-los ao passo seguinte. Então, parei por instantes. Os pés formigavam. Tinha alguma coisa movendo-se dentro. Firme, segui. Quanto mais subia senti que raízes nasciam nos pés. Fiquei apavorado e deu vontade de retornar. Abortar.  Entretanto, meus olhares fumegaram e se encheram de paixão pela rosa que me aguardava; paixão essa que eu nunca havia sentido antes. 

Quase no topo da montanha senti cheiro de folha verde em minhas mãos. Fotossíntese acontecendo em mim. Estavam leves e macias, indefesas ante o sopro do vento conduzindo-me como numa valsa. E já no cume da montanha, para minha surpresa e espanto não vi a rosa. De repente, caíram lágrimas, pétalas banhadas pela brisa. A rosa que contemplei, esta mesma que me fez subir ao encontro dela, há muito tempo habitava e crescia formosa em minhas profundidades desconhecidas. O encontro, na verdade, era comigo mesmo.

VIVER A POESIA



Viver a poesia não pertence a quem a compõe. Nem é somente para o paladar exclusivo dos "aficionados" por este gênero. Nutrir-se de poesia é próprio da fome humana. A todo instante não só fazemos poesia como ela nos possui, sentindo-nos possuído por ela. Há cumplicidade. O cotidiano é grávido de poesia em cada suspiro de espanto diante do natural que se agiganta na alma. A folha que cai não é mais só um movimento corriqueiro que o vento ou a madurez decide desfazer-se dela. Nem mesmo nossa solidão parece ser o vazio que traz angústia, mas de modo novo me traz a mim mesmo. O natural se agiganta na alma e transforma o olhar, as vísceras, as entranhas de nosso de nosso ser.

Viver a poesia no pão com manteiga, no café quente incensando o amanhecer, no bocejo do corpo, nos passos dorminhocos, nos pássaros esvoaçantes e seus ritmos peregrinos em nossos poros melódicos e, acima de tudo, no grito do espírito pelo absurdo da existência que se põe diante de mim.

Viver a poesia é crer no além das entranhas da pele ou mesmo no desfragmentar-se do corpo. Isso é loucura, concordo, mas viver sob os auspícios dessa crença é uma loucura tão real, ousada, bacana e excitante, que outro não conseguiria arranjar outro signo lingüístico para definí-la senão, viver a poesia.