sábado, 16 de abril de 2011

GENEALOGIA DOS ANJOS - VII capitulo Asas de Deus

VII CAPITULO



Muitos anos se passaram desde que Homero foi libertado da prisão. Passou por uma terapia para recuperar-se da tragédia. Entretanto, o anjo sempre estava em sua casa, à noite. Certa vez, viu o vulto de um ser saindo pela janela e acreditou ser o anjo. Continuou a aparecer outras vezes em lugares públicos que Homero costumava frequentar, apesar de que nunca o via bem próximo. Homero disfarçava para evitar que fosse diagnosticado como louco. Tinha a convicção de que anjos eram seres enviados do céu para nos acompanhar durante a existência e que cada um tinha o seu.  
Homero estava concentrado em sua busca pela história desses seres tão conhecidos da mitologia. Debruçou-se sobre a Angelologia. Pegou a Bíblia que tinha em casa para ver as referências bíblicas que encontrasse sobre seu estudo dos anjos. Talvez fosse loucura mesmo de sua cabeça, mas ao menos, conheceria mais de anjos. Tinha a impressão de que um anjo observava-o em sua busca. Até brincou com essa possibilidade, pois levantou a xícara de café e ofereceu a ele que supostamente estava lá na cadeira de balanço. Leu sobre o significado do nome Anjo e depois viu uma referência ao livro de Daniel 5,6 sobre a forma física de um anjo: “ anjo vestido de linho, os seus lombos cingidos com ouro fino de Ufaz: seu corpo era como o berilo, e o seu rosto como um relâmpago, seus olhos como tochas de fogo, e os braços e os seus pés como o brilho de bronze polido, e a voz das suas palavras como a voz de uma multidão ". Ficou pensando na imagem do seu anjo. Meu Anjo, disse rindo do modo como se referiu ao ser. Demorou na expressão que encontrou sobre umas das denominações dadas aos anjos: “anjo da Presença de Deus”. Se é verdade que Deus estava tentando responder sua súplica, então este anjo que estava aparecendo devia ser um anjo especial na hierarquia angelical. O livro de Isaías fala de anjos com seis asas, os Arcanjos. Lembrou que o anjo junto ao canil aparentava ter mais de duas asas. Seria um Arcanjo? Tinha que tirar a prova. Segundo consta no seu estudo identificavam-se quatro anjos do rosto de Deus, Miguel, Gabriel, Uriel e Rafael. Quais destes estariam ali?
A campainha tocou. Era um grupo de estudantes da faculdade convidando-o a fazer parte de um projeto voluntário na favela. Deixou que entrassem. Um de seus companheiros de classe, muito curioso, viu que Homero pesquisava sobre anjos.
- Homero, você está muito religioso! - disse com ironia.
- Ah, sim. É uma pesquisa que minha tia, que faz teologia, pediu para fazer para ela. - disse dissimulando.
- Que legal. Eu gosto muito de anjos. - Eliana disse curiosa, vasculhando as anotações de Homero.
- Por favor, gente, não baguncem minhas anotações. - pediu com certa chateação.
Os anjos acompanham os mortos em suas partidas desta terra , sabia?
Homero ficou interessado com a intervenção de Eliana.
- É mesmo? E o que você sabe mais de anjos? - Lembrou das perdas e da presença do anjo.
- Bem, existem muitos tipos de anjos. Há aqueles que curam com o toque, os que vigiam, abençoam, dão instruções, combatem por nós, tiram o medo, nos advertem, libertam e também os que nos acompanham todos os dias. É como bombril, mil e uma utilidades. - terminou com essa piada, mas foi infeliz, pois ninguém riu.
Homero intuía que as várias vezes em que os anjos apareceram eram anjos com especificidades distintas, mas nunca parou para refletir sobre isso. Pediu para Eliana ir ver o café, enquanto ele anotava algumas coisas para não esquecer. Anotou as vezes em que o anjo apareceu e deixou uma nota de lado, “catalogar as aparições”. Logo se dirigiu aos presentes perguntando pelo projeto que traziam. O trabalho voluntário era um serviço que se prestaria às pessoas carentes da favela em parceria com a associação. Homero deu uma olhada no material e se dispôs a ajudar. O café chegou. Tomaram, conversaram, brincaram e fizeram planos para o final de semana. Quando todos se despediram, Homero voltou para seus escritos sobre os anjos. Fez a catalogação das aparições dos anjos desde a morte de Lúcia. Viu que o anjo que levou o menino, Lúcia e o avô da garota que conheceu eram anjos que acompanhavam os mortos. Aquele que curou a mulher no mesmo leito em que estava Lúcia devia ser um anjo que curava, o arcanjo Rafael, o mesmo da prisão. Recordou também do anjo lá no cemitério; este devia ser um anjo consolador. Não quis recordar a história e a tragédia com Fofa. De repente,  seu aparelho de som começou a tocar sozinho. Espantou-se. A música que soou era de Cidade Negra, Anjos. Ficou rindo sozinho. Um anjo que gosta de música e, ainda por cima, música que fale dele; que anjo convencido, pensava. Saiu rindo para a cozinha pegar um cafezinho e ouvir a música que por sinal era linda. “ onde estão os anjos? Onde os anjos? Os anjos estão aí!” dançava e cantava a música no meio da sala. Entrou em clima de êxtase e era como se dançasse com seu anjo. Não sabia Ele que bailava com o próprio Deus.  Terminada a música, foi para o quarto e instintivamente ajoelhou-se e rezou a oração que aprendeu ainda criança:
“Santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador que a ti confiou a piedade divina, sempre me rege, guarda e governa, amém.”
Benzeu-se e foi dormir. O anjo permaneceu no quarto até o amanhecer e se foi. 


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