quinta-feira, 10 de março de 2011

CORDILHEIRA DA ALMA




A alma apaixonou-se de imediato pelas cadeias de montanhas que adentraram com intensidade o pulsar existencial. Permaneci perplexo ante a colisão com a inocência de meus sentimentos. Era novo o modo como as pulsações iam e viam no interior de minhas cavernas. Bailavam e me levavam na dança, como se guia uma criança. Não tinha forças para resistir. Nem queria! A alma deixou-se enroscar pelas gigantescas pedras tão leves e macias cercando e circulando nas artérias do coração. Já estavam por toda a parte. Mas não se prendiam.

Queria que ficassem e se tornassem parte de mim eternamente. De súbito, inspirei profundo, repetidas vezes ainda com mais ânsia, tentando exalar e roubar o espírito delas, mas mesmo assim, fracassei no desejo. Então, mudei de estratégia e soprei com
força meu espírito sobre elas, tentando invadir as protuberâncias e os desfiladeiros de seu coração; porém, o sopro perdeu-se na imensidão das colinas e não era mais que pó. Mas, quando se está apaixonado e por cada poro vive o Mistério da Montanha e seus encantos, o fracasso ou a aparente derrota, não são palavras que detém uma certeza. A vontade de ter o bem amado nos move e nos inquieta os passos modelando nossos contornos de tal forma, que nos trazem apetite e perseverança.

A paixão pela Montanha já não tinha como negar e tão pouco, meu anseio por possuí-la eternamente nas camadas mais longinguas de minha alma. A paixão reveste-se dessa dor, dessa necessidade, quase dependência. Por mais que eu imaginasse uma cumplicidade entre nós dois, tinha impressão que mesmo ela tendo tomado a iniciativa, só eu tinha sentimentos de posse. Movido pela ganância de ter seu amor todo só para mim, guardei-me sem reter outras substâncias, almejando que ela fizesse o mesmo. Nem assim, ela se permitiu se aprisionar em mim.

O amor não é um produto que se compra ou se negocia. Nem se ganha pela violência. Amar é atitude de liberdade tão grande e intensa que o fato de uma Montanha acomodar-se num pequeno ser como eu, era uma prova infinita de amor. Entendi que não era fácil para mim compreender seu gesto no início. O amor precisa discernimento.  Amor se conquista ao se deixar ser conquistado. E desde então, não mais inspirei, nem mais soprei. Tomei a mesma postura da chegada dela em meu interior. Vislumbrado com a doçura que exalava de suas grandezas.

Pouco a pouco, quando deixei de exigir ou querer aprisionar, e somente degustava suas entranhas em minhas entranhas, então, as Montanhas deixaram se formar em mim outra grande cadeia de montanhas, mais bela e deslumbrante que a primeira, a verdadeira Cordilheira, aquela que nascia das profundezas de sua alma e que não me alcançaram antes devido ao egoísmo de minha paixão.

Sou Cordilheira, antes da paixão, pela paixão e nela. O que vês no exterior, essa fortaleza que amedronta e fascina, na verdade tem seu sustentáculo e razão de ser nas profundezas que não podes vê. Assim também é o ser Cristão e todas as formas de amar.

2 comentários:

Mércia disse...

Magnifico texto, só veio complementar algo que estou lendo sobre o amor, no livro "mulheres que correm com os lobos". Qualquer dia desses compartilho com você.

Estou adorando entrar aqui e ler teus textos.

Oliveira Sousa disse...

Oi Mércia,
fico feliz que estas letras ajuntadas te movam a ser mais!
abraços e ânimo sempre

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