domingo, 17 de abril de 2011

GESTAÇÃO DA PEDRA





     A vida brotou de uma pedra. A ciência poderia encontrar uma explicação e a religião chamaria de milagre. Mas ciência e religião se opõem quando a questão é fundamentar. Ou não!? Bem, o certo é que o fato aconteceu e, ilusão ou não, a pedra encontrou um algo mais em sua inércia.
Era uma manhã tranqüila e corriqueira. À vista daquela massa sólida de terra comprimida, a vida acontecia. Não a dela, mas a dos outros que se lhe descortinavam, ora passivos, ora indignados, por sua ignóbil presença no caminho. Mas um fato mudaria para sempre o ser da massa sólida, melhor dizer, em respeito à sua dignidade, da pedra.
Um pássaro em busca de sossego para degustar seu alimento, sobrevoava a área escassa de árvores. Pousou sobre a pedra. A semente foi lançada pelo pássaro que havia feito sua refeição. Foi-se o pássaro. Talvez, nunca mais tornaria a voltar. Permaneceu a semente como lembrança daquela ceia. Seria impossível para a semente sobreviver e germinar naquelas circunstâncias; o sol não era favorável. A pedra não tinha qualidades ou carregava em si a façanha de gerar. Estava fadada à imobilidade, à infertilidade. Porém, a semente resistiu. Acreditava piamente na possibilidade, ainda que remota, de renascer da pedra.
Dias se passaram. Os raios solares a secavam. Ainda assim, contra toda ausência de sinais de vida, a semente permanecia firme na sua confiança e esperança depositada na pedra, que por força do destino a havia acolhido, ou melhor, suportado sua presença. Na verdade, a pedra achou aquilo um insulto daquele pássaro insano. - Onde já se viu deixar morrer em cima de seu nariz, a esperança, o início e o fim, enfim, a semente?! - Proferiu com ares de boa advogada de defesa.
Era evidente, não tinha como negar, a indignação por sua impotência em contribuir com alguma coisa... Com o tempo e a persistência da semente, a pedra, deixou-se vencer e, então, sentiu desejo de gerar, deixar gerar. Sorriu, achando loucura tais pensamentos e sentimentos que a acompanhavam. Amaldiçoou a estada da semente. Não era possível tal mudança em seu ser. Não havia essa possibilidade. Desejou que soprasse um vento violento e junto a levasse para bem longe. Mas a semente já estava colada, muito enraizada em suas nuances.
 De madrugada, a pedra sentiu calafrios e transpirou. Sonhava caminhos novos, no horizonte, uma linda flor apresentava-se diante dela. Causava-lhe tantas alegrias e gozos que mais e mais transpirava. Ao acordar, sentiu um leve peso, mais do que o costume. Chorou demoradamente pela flor que nela nascera. Sua inércia gerou movimento, e a força impetuosa do movimento transformou-se em vida.
A pedra que és jamais se tornará flor, não nasceu para isso, mas poderá ser capaz de gerar... Não há vida fechada, nem abismo, nem qualquer obstáculo posto à vida que faça morrer em ti a semente deixada por alguém, um sonho, sopro de vida. Aquilo que és capaz de realizar e o que verdadeiramente és vai muito além do que dizem ou do que pensas de ti mesmo.

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